quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Ervas Daninhas, Alain Resnais

Ervas_Daninhas Ao final da projeção a plateia já deveras atordoada com o rumo dos acontecimentos é brindada com um sequência de passeios com câmera até chegar no rosto de uma garotinha, que por sua vez faz a seguinte indagação “Quando eu for um gato posso comer comida de gato?”. E o filme acaba e nós ficamos no vácuo tentando localizar onde isso se encaixa na história que acabamos de ver. Lógico que há pessoas que vão sair irritadas do cinema, outras vão sair como se tivessem descobrindo algo mas não soubessem exatamente o que é, e há pessoas que vão se divertir bastante com as situações absurdas do filme. Atualmente aos 87 anos o enfant terrible do Nouvelle Vague continua a chamar as pessoas a sala de projeção sem ter um estilo específico e sempre surpreendente.

Dentro da obra diacrônica de Resnais esse é uma continuação temática de seu último trabalho Medos privados em lugares públicos,  vide que a matéria prima do filme são as intricadas relações humanas, contudo é totalmente diferente em sua concepção, se em Medos o maior charme está nas histórias que se entrecruzam em uma Paris paralisada com a Neve, o roteiro de  Ervas Daninhas é extremamente simples sua execução que é complexa.

Marguerite (Sabine Azéma que também estava em Medos Públicos) é uma mulher estranha que tem sua bolsa roubada, Georges Palllet (André Dussollier, perfeito) acha sua carteira e partir daí começa um caso de amor a primeira vista, ou a primeira neurose vide que Georges é outra pessoa muito estranha. Parece simples mas não é, Resnais destrói a primeira premissa de amor à primeira vista quando ele só se encontram no terço final do filme e Georges pergunta para riso geral “então você realmente me ama” . A relação desenvolvida antes disso é quase uma psicose de Georges em perseguir Marguerite no telefone, espionando-a e imaginando em sua própria solidão o porquê dela não querer conhecer a pessoa que encontrou sua carteira. Depois que ele para de  importunar-la é a vez dela de se sentir angustiada com a solidão que a falta dos telefonemas de Georges. (?). Paixão? Loucura? Psicose? O fato é que um relacionamento estranhíssimo.

Junte-se a isso o fato de termos vários gêneros dentro do filme do romance, a sátira deste, temas noir, comédia de humor negro e um desempenho estrondoso dos dois atores principais, aliados a câmera nada simples de Resnais que filma os dez primeiros minutos sem mostrar o rosto dos personagens, usufrui de câmera lenta, sátiras do cinema e joga ervas daninhas em nossa cara toda vez que a história toma outro rumo. O enfant terriblé! Se à algo constante no filme é seu clima de surrealismo que só se torna perceptível no final quando você já está atordoado, mas pontua o filme desde de seu início (Ele começa com uma grande descrição de pés), pronto a salada está completa.

Outro ponto importante da película é o fato de escutarmos o pensamento dos personagens e como sas neuroses são pautadas por coisas sem importância, ou mais especificamente por besteiras. Georges começa sua perseguição pelo fato de Marguerite no telefone não ter querido conhece-lo pessoalmente, Marguerite por sua vez vai atrás dele primeiro por querer saber se ele está bem, depois por ele não estar mais reparando nela. Esses pensamentos de situações pequenas que se desenrolam em tempestades interiores talvez sejam as ervas daninhas do ´titulo, aquilo que começa pequeno e depois é calo no cérebro nos incomodando de maneira importuna. Assim também é a última frase do filme, que por parecer não ter lugar dentro da história fica remoendo em nossas mentes. Um presente de Resnais para seu público? Talvez. Com 87 anos e ainda um enfant terrible.

2 comentários:

henrique mariani disse...

Assisti o filme esta semana e concordo com a expressão "enfant terrible". Fico imaginando a sensação de êxtase do diretor, ao notar as reações do público.
Saimos do cinema, eu e minha companhia, discutindo o significado (haverá algum?) da pergunta da menina! Mas queria observar que a tradução pode nos levar por caminhos diferentes, se traduzirmos a palavra "folle" por louca ou rebelde e não daninha.
Pensem a respeito..!
Mas o filme é ótimo!

Rafael Menezes disse...

Obrigado Henrique. Não sabia do duplo significado que a palavra tem no original, com certeza encaixa com mais perfeição.
Um abraço