domingo, 19 de julho de 2009

PRIMAVERA NUM ESPELHO PARTIDO, Mario Benedetti


"... mas sentindo-se estupidamente culpado e sua liberdade, e a outra estava lá, em clausa e em luta, acompanhada e solitária pensando provavelmente em mim, pensando em mim me sentindo estupidamente culpado"

“Pode o tempo mudar quem amamos?” na contracapa do livro esse comentário resume toda a obra deste que foi um dos nomes principais da literatura latino-americana, e é com muita tristeza e pesar que falo foi, pois ele faleceu há alguns meses. Tendo escrito A trégua o que já seria um feito inigualável, Primavera é uma obra tão boa quanto senão m certos aspectos superior.
O genial da composição é que ao mesmo tempo em que ela pode ser sintetizada na sentença acima, é uma questão muito complicada. A Trégua é o romance do reencontro do amor e de todos as bifurcações deste, Primavera é seu oposto é como se dá a perda incondicional mesmo com todas as circunstâncias a favor.
O eixo da história é o relacionamento de Santiago e Graciela, casados há dez anos e separados á cinco anos, porque Santiago foi preso na ditadura (o romance se passa 1980), assim ele vive suspenso do tempo relatando em cartas apaixonadas a nostalgia e memória de seu tempo livre, assim como seus sonhos e esperanças, do outro lado temos a voz de Graciela que se dá conta que não precisa mais de Santiago, pelos rumos que a vida tomou, pelo amor que não tem mais no coração por Santiago. E no meio disso ainda temos as impressões do pai de Santiago, vivendo um novo amor e a realidade de um filho enclausurado, Beatriz a filha de nove anos, um outro personagem que funciona como a voz de Rolando Austero, um novo amor na vida de Graciela, cada um com sua perspectiva da história, e ainda temos a parte real, os relatos de Mario Benedetti nos países em que passou durante seu exílio.
Assim temos um plano em que a perseguição política, violência cega e perigo iminente constituem o panorama do Uruguai durante a ditadura (1975-1985), mas no plano central temos uma intensa discussão do que é amar nos tempos modernos, o que é salientado pelo destino do pobre personagem de Santiago, preso por sua vida e condenado a sofrer em sua volta para casa, ele é o mais inocente dos personagens e mais trágico, em dado momento Graciela comenta que se Santiago estivesse ali seria mais fácil, seria normal, ela estaria desapaixonada por ele e eles resolveriam isso como duas pessoas em processo de divórcio, o que não é natural é ele estar preso. Será? Não são as respostas que nos satisfazem, mas essas perguntam retóricas que nos alumbram, em dado momento ela pergunta ao sogro se deveria contar que não o ama, e ele diz que se fizesse isso ele não teria perspectiva e sucumbiria. Não há resposta fáceis no teatro da vida alguém disse certa vez e o livro de Benedetti comprova isso e também concorda com os preceitos de Zygmunt Baunman, que dando o braço a torcer, nos diz que o amor é líquido, e talvez seja.

Um comentário:

rafael kalebe disse...

Belissima critica meu amigo !!
Concordo qdo voce questiona , isso é mais facil mesmo ??
" Estar preso " é muito relativo ( eu sei que nesse caso especifico , não ) , muito complicado alguem depositar tantas coisas em outra pessoa. Acho que o baumann esta certo qdo fala do amor liquido.
triste , mas muito real.
Benedetti é o cara.