sexta-feira, 22 de maio de 2009

Da eterna briga entre inimigos antigos

E logicamente estamos falando da literatura e do cinema, inimigos mortais em artes distintas, amantes ideais na criação artística, parece uma relação amorosa moderna. Sempre um livro se torna um filme é uma expectativa crescente que ele se iguale a obra original, quando não ultrapassa: O chefão é um romance normal, o filme de Coppolla é maior obra-prima da década de 70. Senhor dos anéis tem um sucesso similar em letras ou em imagens, quando a obra literária é muito admirada repetir o sucesso é mais complicado mas não impossível, mas tudo se facilita quando o texto desconhecido de Arthur Schnztler vira uma obra de Kubrick, e é tão perceptível quando Eragon, vira... Sessão da tarde!
O primeiro livro adaptado de Dan Brown foi o Código da Vinci, e foi em termos de obra cinematográfica autônoma, uma experiência arrastada para as platéias do mundo, o que não impediria de ser um filme legal, contudo por seguir o texto do livro capítulo a capítulo perdia muito de sua força nas telas, e muito porque metade do mundo já conhecia a história.
O segundo livro a ser levado para a telona é Anjos e demônios que aprendeu a lição do Código e deixou a trama extremamente rápida e agradável para o expectador a procura de um bom filme de ação, contudo tirou muito o texto original não se tornou nada mais que um bom filme.
É quase uma obsessão masoquista a questão da comparação, no grau mais íntimo sabemos que a transposição de uma arte para a outra é uma questão de adaptação, que um filme nunca poderá ser um livro e vice-versa. Mas aqui estamos nós criticando o Código por respeitar demais, e o Anjos por cortar de mais.
A História do filme se passa após os eventos do Código, Robert Langdon, o personagem de Tom Hanks, não é a pessoa mais querida do mundo Cristão, com sua teoria sobre Maria Madalena e linhagem de Jesus, mas incrivelmente o vaticano lhe requisita ajuda, uma vez que tem uma bomba de anti-matéria pronta para enviar a cidade-país ao céu, e cardeias desaparecidos sendo assassinados um a um até o derradeiro momento. Langdon tem que seguir uma trilha escondida por Roma para tentar impedir a destruição da cidade em menos de seis horas, e para isso tem a ajuda de uma cientista ligada a anti-matéria, um camerlengo simpático e toda a guarda de segurança do papado para o apoio, contudo o assassino é só um e mortífero. É um ótimo suspense com indagações teológicas, se mantém constante na direção e no ritmo, sendo que que algumas explicações muito resumidas podem ser o defeito estrutural mais incomodante. No todo o filme cumpre sua função de entretenimento inteligente, com algumas reviravoltas que o mestre Brown soube colocar bem em seu livro. Aqueles que lerão o livro é que vão sentir um pouco a perda de certos elementos da história assim como o empobrecimento de alguns personagens.
Robert Langdon é action-hero mais improvável que apareceu nas salas de projeção, um professor de simbologia cultíssimo salvando o mundo seria lago mais estranho que o professor de antropologia que vira um Caçador de tumbas nos fins-de-semana. Pontos para Tom Hanks que abandona o cabelo feio e faz seu personagem, em uma evolução natural, se tornar mais valente até que o idealizado primeiramente, há mais calor humano e emoção no filme e no Robert também. A atriz que interpreta Vitória Vetra, perdeu muito em relação ao livro, sua personagem não tem personalidade e é só um enfeite dentro do filme, isso se você gostar de estrangeiras anoréxicas, mas é bonitinha. Os demais coadjuvantes tem uma participação boa e dentro dos limites de seus personagens, contudo a interpretação de Ewan McGregor, como camerlengo Patrick é muito boa sendo que seu personagem foi o mais mutilado da transposição. O camerlengo do livro, Carlo, seria um personagem extraordinário e difícil para qualquer ator, sua versão cinematográfica é bem mais plana, mas ele encontra um equilíbrio perfeito entre a tensão do personagem e sua calma exterior. Devo tirar o chapéu para o Ron Howard também, que é um diretor que pessoalmente eu acho muito superestimado mas que indubitavelmente sempre faz um bom trabalho, aqui ele fez da cena de explosão uma das mais lindas que eu vi no cinema e não teve medo de corrigir todas as falhas estruturais que o primeiro exemplar tinha.
Mas que o livro é melhor, tenha certeza que é. Alias The Lost Symbol saí em setembro em terras yankes, Robert Langdon não morreu e acho que a cine-série também não.

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