“... o homem estava caindo? Aquele gerúndio era um desmando nas graves leis da gravidade: quem cai, já caiu.”
Não! Ele está caindo. Um evento dito impossível que pode estar no sonho, mas o final do conto deixa claro que na escrita de Mia Couto tudo é possível, até mesmo pessoas que se demoram a cometer o derradeiro ato. Mestre em metáforas, e eme construir prosas que mais lembram poesias sem verso, brincriando com a última flor do Lácio. Essa é a primeira coletânea de contos que Cia. Das Letras publica, e tal qual Dalton Trevisan faz em sua obra com bem menos originalidade, Mia vai explorar o fértil terreno dos relacionamentos homem/mulher.
Lendas se misturam ao cotidiano, e um realismo fantástico dá vida casas inundadas pela dor, literalmente. Homens que desconhecem o fluir do tempo para envelhecer e dar continuidade a linhagem. A castidade é defendida pela razão e contra a natureza das paixões produzindo um resultado catastrófico em “Saia almarrotada”.
São contos de alta carga emocional, os temas são os mesmos abordados desde sempre: a procura da identidade moçambicana, a juventude contra a velhice, a tradição que briga com a transgressão, mas na escrita de Couto eles são sempre revestidos com imagens poderosas. Os últimos livros de Mia estão longe do humor de último voo do flamingo, ou da história mais centrada no social como Terra Sonâmbula, e nessa coletânea de 2004, o tom é a mesma melancolia de “Venenos de Deus”, com a diferença de aquele tinha um pé calcado na realidade e este é um voo de imaginação, os não familiarizados podem estranhar, os demais quando olhar para trás e ver uma casa afundando saberão que estão em casa.
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